domingo, 30 de maio de 2010

Senta do meu lado
Não diz nada
Eu entendo você calado
Cola no meu corpo

Esquece que estamos mortos
Me ensina a pulsar de novo
Pulsar de novo vermelho sangue
Que é cor de morte de amor
Que é cor de amor de morte
Não sei mais o que eu faço com essa dor que teima em doer mesmo sem saber porque...
As vezes saio correndo querendo fugir, mas depois de um tempo olho pra trás e dou de cara comigo, de novo eu, novo eu sempre a seguir, sempre a me perseguir com dor de continuar viva.

Olhos de ver vida

Sentia-se ofegante, andara muito para chegar ali, era como se aquele lugar o chamasse. A praça estava suja, mal cuidada, abandonada, além dele estavam ali só algumas pombas. Havia muito que ele não ia aquele lugar e com tristeza constatou que aquela praça que antes vivia cheia de crianças, com muitas árvores e muitos pássaros já não existia mais, a sua volta fora construída uma movimentada avenida, havia agora ali muita pressa e quase nenhuma vida.


Sentou-se em um dos únicos bancos que ainda resistira ao tempo e ao descaso e foi nessa hora que as lágrimas começaram a rolar freneticamente dos seus olhos, e conforme as lágrimas inundavam seus olhos, as lembranças inundavam todo seu ser.

Lembrou-se que foi ali (e talvez por isso aquele lugar o chamasse) que ele a viu pela primeira vez, ele estava  pensando o que seria a sua vida de lá pra frente, pois acabara de ser abandonado por sua primeira mulher, e estava só com seus três filhos, estava totalmente desacreditado no amor e no ser humano, e ela se aproximou com seu corpo miúdo, sua pele clara, seus cabelos negros e seus olhos de ver vida e sentou no mesmo banco que ele, e o destino se encarregou do resto, se encarregou de encarregá-la a fazer com que ele voltasse a acreditar no amor.

Ele enxugou as lágrimas, queria que elas estancassem, assim como queria que suas lembranças também estancassem naquele momento, não que os anos que se seguiram não tivessem sido felizes, pelo contrario, mas quanto mais pensava no quanto tinha sido feliz do lado dela, mas a dor no seu peito aumentava.

Ele sentiu vontade de gritar, gritar dor, dor que o consumia desde a véspera quando soube que ela tinha ido embora pra sempre, como poderia viver sem ela, ela que estivera ao seu lado nos últimos vinte anos de sua vida, ele pensou em culpar alguém, ia culpar Deus, mas desistiu, Deus era muito abstrato, não poderia sacudi-lo e gritar na cara dele que o culpado dela ter ido definitivamente embora era ele... Acabou por rir dessa idéia absurda, foi um riso dolorido, mas foi justo quando as lagrimas lavavam seu riso repleto de dor que ele sentiu no ar um cheiro que era muito familiar, era o cheiro dela, olhou para o lado, mas não era ali que ela estava, levantou e começou a procurá-la.

Seus olhos a acharam do outro lado daquela movimentada avenida e ele percebeu que ela o chamava, os olhos dela de ver vida brilhavam como nunca, ele esboçou um sorriso, fechou os seus olhos ainda úmidos, esqueceu aqueles carros que passavam por ali freneticamente e deixou que o vento o levasse até ela.

terça-feira, 11 de maio de 2010


Os suicídios cometidos em tardes chuvosas deveriam ser todos, todos eles perdoados. E independe o motivo pelos quais foram cometidos... O que deve ser levado em conta é que essas almas encharcadas de dor e de horror souberam escolher com maestria a hora de cometer o crime maior contra si mesmo.
Uma tarde chuvosa é uma tarde perfeita para os suicídios, a chuva essa manifestação essencial da natureza para nossa sobrevivência, quando cai à tarde, a tarde toda, toda à tarde até o cair da tarde torna-se insuportável, é como uma mão que no começo parece acolhedora, chega bem de mansinho e de leve vai embalando suas dores, seus mal amores, e vai te envolvendo de uma tal maneira e só depois de muita água já caída, é que essa mão leve solta as suas garras cumpridas e finas que estavam escondidas entre seus dedos, mas você nem percebe que essas garras estão a te rasgar, lentamente a te desfigurar.
Cada gota (e são muitas as gotas - finas, porém contínuas) contribui para te colocar numa espécie de transe, que te faz cada fez vez mais se aproximar dessas garras... E aí doida você sai por entre a chuva a se, rodar, rodar, rasgar e não quer mais parar.
O transe perde seu efeito você toda rasgada se vê estancar e sente chovendo dos seus olhos uma chuva que do céu jamais poderia chegar e é nessa hora que percebe que aquela mão só estava a te enganar e percebe também que é maior a chaga que esta agora a te dominar, e voltam em dobro suas dores, seus horrores e essa chuva que teima em não cessar...chove, chove, chove...chove a tarde toda sem parar e como não pode contra chuva resolve se entregar.
Agora não importa mais se ela vai parar, agora não importa mais quem ela vai molhar... Agora tudo tem menos importância, inclusive você não importa...
Vai e lembre-se que por mim deviam todos te perdoar.